Considerações sobre canas

Este é um artigo de inteira responsabilidade do Sérgio Tente.
Já foi antes publicado no fórum OceanoIbérico, irá ser aqui também publicado pelo seu excelente conteúdo informativo.

"Muito se poderia falar acerca do material disponível no mercado em relação a canas de bóia mas neste tópico esse não será o principal objectivo.
Seria interessante deixarmos aqui algumas das nossas "crenças" pessoais acerca das canas que utilizamos neste tipo de pesca e os "porquês" dessas escolhas.
Todos os amantes deste tipo de pesca já tiveram com certeza uma variedade de varas de diferentes marcas procurando a cada compra que faz a sua cana de sonho. Mas afinal o que é para nós uma cana de sonho ou a cana perfeita?

Algumas considerações (pessoalmente falando):

Em primeiro lugar temos que saber aceitar que nem todos os pescadores tem os mesmos gostos, ideias e necessidades e aquilo que para nós parece o perfeito pode ser para outra pessoa algo banal ou mesmo dispensável, portanto acho que é mais do que aceitável que no mínimo se respeitem os gostos e preferências dos outros.
Muitas vezes existe a tendência de que quem não tem bom material não é bom pescador o que na minha opinião é totalmente incorreto. Não são raras as vezes que encontro pescadores extremamente bem equipados que no final de uma jornada não conseguiram realizar capturas e ao invés pescadores que utilizam material teoricamente fraco fazerem grandes pescarias.
Considero que numa primeira abordagem devemos procurar aprender e a cada jornada que fazemos aprendemos algo de novo, depois à medida que vamos aperfeiçoando a nossa técnica irmos também "alimentando" as nossas necessidades.
Quando se começa a pescar à bóia não se sente a necessidade de ter 3 ou 4 canas para diferentes cenários mas passados alguns anos já temos a ideia de que para aquele pesqueiro, para aquele tipo de mar, para aquela falésia, etc., etc., seria mais indicado pescar com uma cana de acção X e não de acção Y e assim vão aparecendo os resultados.
Uma coisa que tenho aprendido ao longo destes ultimos anos é que quando pescamos de Norte a Sul vamos vendo que cada zona tem as suas tradições e os seus materiais preferidos. Por exemplo quando se vai até à Figueira da Foz é quase uma bandeira local ver os pescadores da zona utilizarem canas grauvell e noutras zonas do país acontece o mesmo com outras marcas e modelos.

Preferências pessoais:

Neste campo as hipoteses de escolha são muitas e cada um de nós vai construindo as suas tais "crenças" e acreditando naquilo que lhe proporciona resultados visíveis.
Na minha optica considero-me um pescador em fase de aprendizagem mas já consegui criar preferências claras acerca das características mais indicadas para as minhas necessidades.
O meu tipo de pesca preferido é a pesca à bóia de preferência com pião mas também gosto de fazer outros tipos de pesca à bóia com características e abordagens bem diferentes:

Algumas abordagens:

- Pesca com pião médio ou grande (+ de 30 gramas)
- Pesca com pião pequeno (- de 30 gramas)
- Pesca com bóias tipo caneta de média gramagem
- Pesca com bóias tipo caneta de gramagem leve

Para estas diferentes abordagens concerteza que uma unica cana serviria mas na minha opinião pessoal preferia utilizar (e utilizo) três canas diferentes todas de 6 metros. Deixei de pescar (com muita pena minha) com canas de 7 metros devido a um problema que tenho nas costas e não tenho nenhuma de 5 metros porque considero 6 metros uma cana mais completa e versátil.



No caso da primeira cana da imagem uma cana mais rija adequada a mares médios e fortes com uma acção até 100g. Utilização de piões pesados e ideal para pescas "brutas" e exigentes.
No caso da segunda cana é a cana que utilizei durante estes últimos 4 anos em muitas das jornadas e tive também uma de 7 metros. Esta cana que considero intermédia é aquilo que considero "pau para toda a obra" mas em mares muito fortes perde um pouco as suas qualidades. Tem uma acção até 80 gramas
No caso da ultima, uma cana muito macia utilizo para pescas muito suaves e com bóias leves. Gosto muito de pescar aos carapaus e às Safias com ela. Tem uma acção de 8-80g.
Pesquei também algum tempo com uma Hiro Power X de 7 metros (das antigas) e gostava bastante da cana. Acção de 20-80g era uma cana macia mas muito certinha nas ferragens.

P.S. - Não quero com isto fazer qualquer tipo de publicidade seja a marcas ou a modelos mas apenas mostrar as minhas preferências

No caso da pesca com pião gosto utilizar canas de acção semiparabólica ou progressiva com características mais "rijas" mas para mares mais calmos utilizando piões leves (15/20g) gosto de uma cana mais macia. No caso de pescas suaves com bóias leves e fios finos uma cana com uma acção tipo 8-80g.

Uma cana certinha, pouco "bambalhona" pode ajudar muito mantendo o fio esticado, o correcto trabalhar da montagem, ferragem e trabalhar do peixe.





Não quer obviamente dizer que estas sejam as opções mais adequadas ou muito menos as mais correctas mas de facto são aquelas que mais me agradam.
Quando pescamos em diferentes cenários e pesqueiros com características especificas também acabamos por nos tornar mais selectivos nas canas que escolhemos:

Exemplos de alguns cenários de pesca:

- Em molhes ou pontões
- Em pesqueiros ao nível da água.
- Em pesqueiros baixos (3 a 5 metros de altura)
- Em pesqueiros altos ou falésias.
- Em pesqueiros com muitos obstáculos à sua frente (rochas)

Para estes diferentes cenários pensamos de imediato no tamanho das canas que na minha opinião devem ter entre 5 e 7 metros. Por exemplo quando estamos a pescar num molhe onde temos uma grande quantidade de pés de galo à nossa frente ou num pesqueiro com muita rocha à nossa frente considero que uma cana de 7 metros pode fazer toda a diferença no momento de tirar o peixe da água mas se a estivermos a falar de uma cana parabólica vamos ter de novo um problema e os 7 metros já não vão ser tão vantajosos. Em pesqueiros baixos ou junto à água com poucos obstáculos uma cana de 5 ou 6 metros será mais indicada e também mais "amiga" das costas do pescador. Pescando alto ou em falésia será aconselhável utilizar 6 ou 7 metros de preferência semiparabóbila ou progressiva porque se torna uma segurança no momento de içar e recolher o peixe não deixando que o fio venha muito junto à parede da falésia correndo assim o risco de partir.
Neste caso mais uma vez vamos ao longo dos tempos criando uma base de dados mental que nos proporciona que possamos organizar a nossa jornada consoante as características do local ou pesqueiro que escolhemos prevenindo desta forma eventuais contratempos ou dificuldades inesperadas.
Terminando esta parte será também importante dizer que existem muitos pescadores a pescar nestes cenários que utilizam outros materias bem diferentes como canas de acção elevada, fundo, chumbadinha, etc., etc., e também conseguem grandes resultados o que mais uma vez prova que a adapatabilidade do pescador ao local de pesca pode fazer toda a diferença.

Ferrar e "matar" o peixe

A ferragem do peixe é como sabemos um factor que pode fazer toda a diferença no final da jornada . Muitas vezes acabamos a jornada a dizer "epá o peixe estava a comer mal" ou "desferrei muito peixe" ou ainda "não conseguia ferrar peixe nenhum". É bem verdade que a forma de o peixe comer varia bastante de um dia para o outro, seja consequênia da lua, cor da água, luminosidade, etc., etc., o que é um facto é que por vezes também se facilita e não se muda a montagem ou a cana com que se está a pescar.



Com mares calmos pessoalmente gosto de utilizar uma cana mais "macia" porque aliado ao material mais suave (bóias leves e fios finos) conseguimos muitas vezes realizar mais ferragens do que quando estamos com canas rijas.
Em mares grandes com ondulação forte e grandes escoas claramente que a cana rija vai trabalhar melhor a montagem e no momento da ferragem será muito mais eficaz.
No que toca a "matar" o peixe uma cana de 7 metros "acaba" muito mais depressa com as investidas de um peixe do que uma de 5 metros, isto claro, aliado ao correcto ajuste ou trabalhar do carreto e da sensibilidade do pescador.

Pescando com mar calmo e materiais suaves pode ter as suas recompensas



Exemplar de 1.600g capturado com mar quase parado, material suave e cana com uma acção de 10-80g.



Resistência das Varas

A resistêcia das nossas canas de bóia é um assunto que muito tem sido discutido. Muitos de nós quando pensa em adquirir uma cana para pescar à bóia um dos primeiros factores que nos preocupa é "quanto peso levanta". Se é certo que existem varas extremamente resistentes eu pessoalmente considero que ter um cesto/rabeca é quase mais importante do que ter uma cana que tem escrito no rótulo que está testada para 4,5 ou 9kg. Claro é que se foram testadas a içar estes pesos garante ao pescador uma certa confiança e credibilidade no momento dos grandes "testes".
Quando estamos a pescar de altura e ferramos um grande exemplar mesmo que tenhamos toda a confiança na nossa cana esta tem que estar em perfeita harmonia com o resto do material. Carreto, fio, destorcedores e anzol também fazem parque da "máquina" e sem um equilibrio entre todas as peças o seu funcionamento vai ser pouco satisfatório.
Em pesqueiros junto à água as coisas são diferentes e qualquer vara desde que bem manejada consegue "vencer" um grande exemplar cabendo aqui ao pescador trabalhar o peixe e saber interpretar o momento e local onde encalha-lo.
Pessoalmente e quando estudo as características da cana que pretendo comprar um dos pontos que preocupa é a resistência da ponteira e 2º elemento de ponteira (devido aos lançamentos com pião e momento de balanço para meter o peixe em terra) e resistência do 2º elemento da cana local onde grande parte da força é exercida. Uma boa cana tem que ser equilibrada sem pontos fracos para que não aconteçam "desastres" que não estavam previstos.

O Vento e o Mar:

Um dos factores que mais pode influenciar a nossa jornada é o vento. Quando não temos nenhum local abrigado e teimamos em pescar com vento neste caso a escolha de uma cana de 7 metros pode ser um desastre porque como dizia a canção "o corpo é que paga". Mas o vento nem sempre é inimigo porque pode fazer tapar as águas e no caso da pesca em si alguns pesqueiros com vento pelas costas faz com que consigamos fazer lançamentos bastante mais longos e "bater" locais que com outras condições seriam inacessíveis. Infelizmente a grande maioria das vezes o vento é um grande inimigo dos pescador.
Quando nos deparamos com mares grandes e estamos a pescar em zonas baixas uma cana de 7 metros pode ajudar bastante pois por vezes como o mar "agarra" no fio traz de imediato a bóia para a margem, nestes casos pescar com canas de 5 ou até mesmo 6 metros por vezes torna-se um autêntico inferno.
No que toca a pescar de altura com mares grandes sem duvida que uma cana mais rija e uma montagem forte vão com certeza facilitar mais a vida ao pescador.
No que toca ao trabalhar de peixe em mares grandes exige-se uma cana (e também carreto e material) que consiga "obedecer" ao pescador a trazer no momento certo o peixe para o local onde o tencionamos tirar. As chamadas "pescas brutas" à bóia em mares que pouco agradam à maioria dos pescadores de bóia podem também proporcionar grandes momentos mas para que tal aconteça exige-se material a condizer.
Pedro Batalha em acção num dia de mares de 3 metros
Limpeza e manutenção

Este é um dos pontos que contra mim falo. Não tendo eu muito a dizer acerca deste assunto deixo apenas algumas dicas que podem ser úteis e que actualmente comecei a fazer:
- No final da jornada e ainda no pesqueiro limpar a cana com um pano para evitar que areias, impurezas ou salpicos de engodo/isco risquem ou estalem a cana quando estamos a recolher os elementos.
- Dar uma passagem em água doce quando chegamos a cana limpa mais convenientemente a cana e tira o sal que vai oxidar e estragar rapidamente o porta-carretos e os passadores.
- Se possível com um pano embebido em vaselina passar com o mesmo em toda a cana e esta fica quase como nova.

Para terminar defendo mais uma vez que muitos de nós temos gostos diferentes e existe muito e bom material no mercado, cabendo ao pescador encontrar os materiais e neste caso a cana que melhor preencha os seus requisitos. Independentemente da marca ou modelo das canas que escolhemos saber ler e entender os locais onde pescamos é o primeiro grande passo.

Abraço
Sérgio Tente

3 Fazer comentário:

Américo Neves disse...

Boas Sérgio

Só quero dizer que escreveste um artigo muito bem elaborado, acho que está tudo muito bem explicito sobretudo para quem tiver duvidas na aquisição de um cana de bóia de acordo com as caracteristicas da sua zona de pesca.

Excelente e um a braço dos Algarves

Anónimo disse...

Boas Américo,

Muito obrigado pelas tuas palavras.
O objectivo deste artigo foi mesmo dar uma ajudita a quem se está a iniciar ou que tem duvidas acerca de algumas escolhas que tenha que fazer.

Um grande abraço para o Carvoeiro

Anónimo disse...

Pessoalmente gosto da pesca Surf Casting, do areal da praia; porém
não existe um tipo de cana que me satisfaça. Por exemplo: existirá
canas telescópicas de 6 metros com
acção 100-150 gr. (mas que não sejam Light) nem excessivamente pesadas, no lançamento? Isso sim,
seria o ideal.